Ao longo das investigações sobre a espionagem ilegal realizada por servidores da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), a Polícia Federal identificou um áudio clandestino de uma reunião entre o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor do órgão, e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). No encontro, eles discutiram suspostas irregularidades cometidas por auditores da Receita Federal ao elaborarem um relatório de inteligência que mirava o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do ex-presidente. Bolsonaro e Ramagem foram indiciados pela Polícia Federal nesta terça-feira por suspeitas de montar um esquema paralelo de epionagem no órgão de inteligência. Flávio não foi indiciado no caso.
A gravação foi apreendida pela Polícia Federal em um computador de Ramagem, em janeiro do ano passado, e compõe o inquérito que apura o uso da Abin para monitoramento ilegal de adversários políticos durante a gestão de Bolsonaro.
De acordo com a PF, no encontro, realizado no Palácio do Planalto, em 25 de agosto de 2020, foram discutidas supostas irregularidades que teriam sido cometidas por auditores da Receita Federal na elaboração do relatório de inteligência fiscal. O documento produzido originou o inquérito contra o filho 01 do então presidente no caso das “rachadinhas”, anulado em 2021 pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) por irregularidades processuais.
O uso da Abin para tentar blindar Flávio no caso das "rachadinhas" havia sido revelada pela Revista Época de 2020. Na ocasião, reportagem mostrou que a agência produziu pelo menos dois relatórios de orientação ao senador e seus advogados sobre o caso.
Tanto Ramagem como Bolsonaro não comentaram o indiciamento pela PF. Em ocasiões anteriores, eles negaram a existência de estrutura paralelas na agência e a participação em espionagens ilegais. A Abin, por sua vez, tem afirmado estar “à disposição das autoridades” e ressaltou que os fatos investigados ocorreram em “gestões passadas”. Em mensagem nas redes sociais à época da revelação do áudio clandestino, no ano passado, o senador negou envolvimento com a chamada “Abin paralela” e disse ser vítima de "criminosos que acessaram ilegalmente" os seus dados sigilosos na Receita Federal.
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A PF aponta que na reunião com Bolsonaro e Ramagem de 2020 também estavam presentes advogadas de Flávio Bolsonaro, que citaram estratégias de defesa que pretendiam adotar.
Durante a gravação, Ramagem afirmou que "seria necessário a instauração de procedimento administrativo" contra os auditores "visando anular a investigação, bem como retirar alguns auditores de seus respectivos cargos".
O relatório da PF com o detalhamento do áudio, que foi encaminhado ao ministro Alexandre de Moraes na época, ainda aponta que integrantes da chamada "Abin paralela" tentaram levantar "podres e relações políticas" dos auditores da Receita.
"Igualmente, em relação às investigações relacionadas ao senador Flávio Bolsonaro, a autoridade policial trouxe informações a respeito do uso da estrutura da ABIN para monitoramento dos auditores da Receita Federal do Brasil, responsáveis pelo RIF – relatório de inteligência fiscal – que deu origem à investigação que apurava o desvio de parte dos salários dos funcionários da ALERJ ('caso da rachadinha'), com o objetivo, inclusive, de 'encontrar podres' sobre os mencionados auditores", diz trecho de despacho do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Também pelas redes, Ramagem disse, na época, que o áudio reforça que não houve “interferência ou influência em processo vinculado ao senador Flávio Bolsonaro”, sendo a demanda resolvida “exclusivamente em instância judicial”.
“Após as informações da última operação da PF, fica claro que desprezam os fins de uma investigação, apenas para levar à imprensa ilações e rasas conjecturas. O tal do sistema First Mile, que outras 30 instituições também adquiriam, parece ter ficado de lado. A aquisição foi regular, com parecer da AGU, e nossa gestão foi a única a fazer os controles devidos, exonerando servidores e encaminhando possível desvio de uso para corregedoria. A PF quer, mas não há como vincular o uso da ferramenta pela direção-geral da Abin”, escreveu Ramagem.
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